Relato de parto: é amor à primeira vista?
Na minha cabeça, antes de ter minha filha, o parto era o momento onde eu me sentiria obrigada a amar aquele bebê que sairia da minha barriga, imediatamente, da forma mais incondicional e perfeita do mundo. E aí, não foi bem assim.
Vamos a mais um dos relatos que quero conversar, uma boa maneira que eu encontrei para que você que me lê me conheça melhor.
Minha gravidez foi aos 22 anos, menos de 2 anos depois do meu derrame – o que era preocupante por questões de saúde. Chegamos a achar que eu era uma grávida de alto risco e, felizmente, a gravidez se desenvolveu normal ao longo dos meses.
Não foi fácil escutar dos médicos que a probabilidade de morte no parto era grande (leia-se: eu ou minha filha), mas serviu para mais uma vez eu valorizar minha saúde e fortalecer minha fé. Minha gestação foi perfeita, assim como o parto.
Deus sempre sabe o que faz, não? Foi uma gravidez saudável, sem nenhum problema significativo, a não ser o mau humor nos últimos dias de barriga no verão paulista.
Dia 24 de março de 2019, meu marido e eu fomos sair com amigos. Aquele almoço que se estende e acaba 9 da noite. Eu, a grávida de barrigão lá super disposta nas 37 semanas, com o zíper do shorts aberto no final! Fomos pra casa, eu dormi meio estranha. Acordei de madrugada comecei a sentir coisas ainda mais estranhas: dor, fraqueza, insônia. Difícil de explicar.
Lá fui eu para o banho, para a sala, para a cozinha, nada de melhorar. Meu marido e minha mãe estavam desmaiados, minha obstetra demorou mais de 2 horas pra me responder.
e só confundi mais minha cabeça. Algumas horas depois, a confirmação da obstetra: “Nicole, vá para o hospital, mas pode ir com calma!” Calma? A dor que só aumentava já era inconfundível, nunca tinha sentido nada igual. Nunca fiz questão de parto normal e minha mãe implorava pra que eu não fizesse, já que ela achava que meu cérebro iria explodir de tanta força (coisas de mãe).
Cheguei ao hospital pedindo para ir pra cesárea. Eu nunca tinha entrado em uma sala de cirurgia na vida, então todos aqueles equipamentos, tesouras, panos eram assustadores, como num filme de terror. Nunca tinha parado pra pensar no que significava LITERALMENTE cortar a barriga pra tirar uma criança de dentro e comecei a ficar apavorada.
Chorei e precisaram me acalmar, estava com medo de verdade. Quando deram a anestesia e eu passei a não sentir mais minhas pernas, piorou. Me senti tendo um AVC de novo, e o desespero só aumentou (quando eu tive o derrame, não conseguia sentir minha perna, exatamente a mesma sensação, desesperador!) Não me lembro de muitos detalhes além da tremedeira e o medo quando colocaram aquele mini serzinho no meu colo, e minha reação automática foi gritar “meu Deus! O que eu vou fazer com ela?”
Mal consegui pegá-la no colo de imediato e desabei a chorar. De emoção, felicidade, medo, ansiedade, tudo junto. Que momento doido! Aos poucos a adrenalina diminuiu, a ficha começa a cair e quando vi, já estava com minha filha no colo amamentando. Ali, em um momento tão íntimo, um neném tão frágil e dependente agarrada em mim literalmente sobrevivendo com o meu leite. É impossível não transbordar de emoção, mas não posso dizer que senti o maior amor do mundo assim que olhei pro rostinho dela.
É uma relação a ser construída. Pra mim, esse amor mais se desenvolveu do que “nasceu pronto”. Afinal, tínhamos acabado de nos conhecer.
É difícil de explicar a estranheza de não sentir aquele amor à primeira vista que todo mundo diz. Mas é minha filha, meu parto, eu não deveria estar sentindo? No momento me senti péssima. Hoje entendo que esse amor incondicional nós construímos. Dia após dia, que cresce, se fortalece. São duas pessoas que estão se conhecendo, que vão se amar mais que tudo, naturalmente, mas uma mãe que não precisa se culpar por não sentir tudo isso de imediato. E aí se inicia o maior amor do mundo. Cheio de desafios, medos, aprendizados, até mesmo dores. Mas o amor, que, na minha opinião, nos transforma, transborda e parece nunca parar de crescer. E começa também uma nova vida.
Tem também o tal do “pós parto”, mas essa história vamos deixar pro próximo, ok?
Com todo meu amor, de mãe,